Depois de ler Clarice, veio a vontade de contar a minha vida também.
Deve existir um bom texto na multidão da cidade, no trajeto diário, em
Niterói ou no Rio de Janeiro. Deve existir alguma crise existencial
quase poética nas malas que um monte de gente carrega para passar o dia -
nas minhas, algumas frutas, o salto alto que substitui a sapatilha que
anda sozinha, maquiagem pra esconder a noite mal dormida e as tantas,
tantas letras que leio pra fugir do tempo perdido no trânsito, quando eu
consigo passar pelo caos sentada.
Talvez exista alguma história boa na vida das pessoas que esbarram,
aceleradas, naquelas que insistem nos passos mais tranquilos, tão únicos
diante de tanta velocidade - eu sou dessas, que passa sem ver e que
chama mentalmente de "lerdo" aquele que obstrui meu caminho. É feio, mas
assumo. Sou impaciente, ando rápido, quase corro. Vivo atrasada porque
não sou muito organizada e sempre esqueço, perco, não encontro, não me
encontro antes de sair de casa, antes de sair de e para qualquer lugar.
Faço tudo ao mesmo tempo e mal olho ao meu redor - no meu umbigo eu me
perco. Nem sei como faço poesia. Talvez eu até saiba: olho tão pouco pro
mundo que quando olho fico maravilhada ou muito decepcionada. As duas
coisas me trazem a inspiração.
Já me perdi. Eu sempre me perco ao falar da minha vida, de mim mesma. É
que vou escrevendo e depois que eu escrevo eu acho que não é bem assim.
Tenho a impressão de que tenho várias vidas, de que sou muitas e as
muitas que sou discordam entre elas (ou entre eus). Uma vez me disseram
que era falta de água no mapa natal, que quem é pouco líquido não se
entende muito mesmo. Pode ser. Pra ser sincera, pra mim isso já serve de
justificativa - soa curto e improvável, como deve ser a resposta pra
quem precisa de uma.
Termino este texto - sim, termino porque sou impaciente, ando rápido,
quase corro e estou de saco cheio - com a impressão de que é melhor escrever poesia. Ela vem
pra mim como um clarão. Escrevo quando me vem um verso, às vezes com
ritmo e tudo. E flui. Nem penso. Quando releio, parece que não fui eu.
Algumas linhas, muito em cada uma, muita coisa e muitas interpretações
em cada palavra : perfeito pra quem não se acha e que, de tão perdido,
encontra um sentido.
Rebeca dos Anjos
5 comentários:
Você é eu! :)
Beijos
(Porém sou organizado e não me atraso...) XD
Faz sentido. :)
Eis aí quem abre o caminho de muita gente.
adorei a fluência deste teu texto e me vi nele um monte de vezes! beijos
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